Área de influência da BR-319 tem recordes de desmatamento e focos de calor
O ano de 2021 foi um dos mais difíceis para a Amazônia, pois a devastação do bioma, em diversos sentidos, avançou a passos largos. Seguindo esta tendência, a área de influência da BR-319 registrou recordes de desmatamento e focos de calor. As informações fazem parte do relatório Retrospectiva 2021: desmatamento e focos de calor na área de influência da rodovia BR-319, produzido pelo Observatório BR-319 (OBR-319) e divulgado nesta segunda-feira (7). O conteúdo apresenta dados e análises que mostram que municípios que nunca tinham registrado números expressivos, como Tapauá (AM), se destacaram no monitoramento. Além disso, chama a atenção o Estado do Amazonas, por onde passa a maior parte da rodovia, que vem se consolidando entre os que mais destroem a floresta na região.
Quinze por cento, dos 1.036.550 de hectares (ha) desmatados na Amazônia Legal, foram perdidos na área de influência da rodovia BR-319, que teve um aumento de 41% no desmatamento em relação a 2020, sendo o maior registro de área desmatada desde 2010. Para 11 dos 13 municípios monitorados pelo OBR-319, 2021 foi o período de maior desmatamento nos últimos 11 anos.
Os seis municípios que tiveram maiores índices de desmatamento estão ao sul da BR-319: Lábrea, Porto Velho, Humaitá, Manicoré, Canutama e Tapauá. Juntos, representaram 94% do total desmatado nos municípios da BR-319 durante o ano. O município de Lábrea foi o destaque na lista de registros mensais, liderando o ranking nos meses de março, abril, maio, junho, agosto, setembro e outubro. Já Tapauá apresentou o maior aumento em comparação a 2020, com alta de 192%.
Calor
O aumento de registros de focos de calor também foi preocupante. Os 13 municípios da área de influência da BR-319 somaram mais de 10 mil focos durante 2021, um recorde para os últimos 12 anos e aumento de 9% em relação a 2020. Além disso, Lábrea e Tapauá registraram o maior número de focos de calor da série histórica.
O desmatamento e os focos de calor afetaram também as Áreas Protegidas na região da BR-319. A Reserva Extrativista (Resex) Jaci-Paraná e a Terra Indígena (TI) Karipuna, em Rondônia, apresentaram os maiores índices referentes ao desmatamento e focos de calor entre as Unidades de Conservação (UCs) e Terras Indígenas (TIs), respectivamente. A UC registrou 654 focos de queimadas e perdeu 7.818 ha para o desmatamento. A TI teve 81 focos e 1.091 ha desmatados.
Ações de combate
Se a alta de desmatamento e de focos de calor já preocupam, a retrospectiva do OBR-319 aponta ainda poucas ações efetivas de combate aos ilícitos ambientais e para proteção de populações indígenas e tradicionais que vivem na região, como o caso da TI Jacareúba/Katawixi, que, até agora, não teve renovada a sua Portaria de Restrição de Uso, instrumento legal que protege populações indígenas em isolamento voluntário.
O relatório destaca a realização de audiências públicas sobre a pavimentação do Trecho do Meio da BR-319, marcadas pela pouca participação de moradores de comunidades da rodovia e pela apresentação de estudos incompletos sobre o processo. Para a pesquisadora Paula Guarido, os resultados apresentados na retrospectiva não são compatíveis com os discursos do governo federal sobre a rodovia. “O que mais me chama atenção, é que no momento em que o processo de licenciamento está avançando em alta velocidade, o desmatamento e os focos de calor na região atingem seus maiores valores desde 2010″, alerta.
“O discurso de que a BR-319 será uma estrada modelo em relação às questões socioambientais, não é compatível com o que vemos nessa retrospectiva. Para que isso aconteça, é preciso uma maior efetividade dos programas de combate ao desmatamento e aos focos de calor.”
– Paula Guarido, pesquisadora do Idesam/ Observatório BR-319
O relatório será encaminhado para autoridades e órgãos competentes para orientar a tomada de decisões a respeito da rodovia.
O OBR-319 realiza, desde 2018, o monitoramento da área de influência da rodovia, em 13 municípios dos Estados do Amazonas e de Rondônia, e mais 42 Unidades de Conservação (UCs) e 69 Terras Indígenas (TIs). As informações são obtidas pelo Sistema de Alerta de Desmatamento (SAD), Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) e pelo Programa Queimadas, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). A retrospectiva completa com dados sobre a área de influência da BR-319, em 2021, pode ser acessada no site do Observatório BR-319.
BR-319: monitoramento e recomendações
O impacto do asfaltamento da rodovia BR-319 nas mudanças de cobertura do solo, nos movimentos migratórios e no bem-estar das populações que vivem nessas regiões é a principal linha de atuação da iniciativa no Idesam, que integra o Observatório da BR-319. Desde 2009, o Idesam atua em fóruns e consultas públicas, onde busca destacar a importância da realização de um processo transparente e que atenda a todas as normas e exigências socioambientais para a conclusão da obra.
A iniciativa é responsável pela criação do Observatório da BR-319, que reúne várias organizações e ambientalistas que atuam na região, com o objetivo de garantir as salvaguardas socioambientais para as comunidades afetadas pela rodovia. Com apoio financeiro da Fundação Moore, as ações são encabeçadas por organizações como CNS (Conselho Nacional das Populações Agroextrativistas), Coiab (Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira), ONG Casa do Rio, Idesam (Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável da Amazônia (Idesam), IEB (Instituto Internacional de Educação do Brasil), FAS (Fundação Amazônia Sustentável), Transparência Internacional, WCS (Wildlife Conservation Society) e WWF-Brasil.