É enganoso vídeo de mulher que usa limão para desacreditar testes de Covid-19

Um vídeo que circula nas redes sociais engana ao sugerir que os testes rápidos de antígeno para detectar a Covid-19 são falsos, tendo como base a aplicação em um deles de suco de limão. Esse tipo de mecanismo foi desenvolvido para entrar em contato com material humano, como a saliva ou fluidos da cavidade nasal. As especificações do fabricante dizem que o uso tem que ser feito de forma adequada, seguindo todos os passos corretamente, sob o risco de inviabilizar o resultado.

Especialistas ouvidos pelo Comprova explicam que o uso de outras substâncias, como o limão, pode interferir de forma incorreta no reagente. Segundo uma hipótese, a causa da alteração no resultado é a acidez da fruta, que é superior a dos fluidos humanos.

No Reino Unido, pais foram alertados de que os estudantes estavam utilizando substâncias similares para “burlar” os testes e serem liberados das aulas. Também há vários vídeos no TikTok, aplicativo bastante usado por adolescentes, que ensinam a usar outras substâncias para conseguir falsos positivos no exame de antígenos.

Apesar disso, quando utilizados corretamente, testes rápidos são uma ferramenta importante para que as pessoas saibam quando devem se isolar e evitar a transmissão do vírus. Por isso, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) liberou, em 28 de janeiro deste ano, a comercialização de autotestes de antígeno em território nacional como estratégia inicial de triagem no controle da pandemia.

O vídeo foi considerado enganoso porque utiliza dados imprecisos e confunde, com ou sem a intenção deliberada de causar dano.

Qual o teste usado no vídeo?

Em determinado ponto do vídeo, é possível observar a embalagem do teste, com um detalhe lateral marcante. Uma comparação com as embalagens de testes de antígenos utilizados no Brasil nos levou ao kit fabricado pela empresa Genrui e, conforme as imagens, é possível notar a semelhança na cor e no desenho dos rótulos.

O Comprova entrou em contato com a 1000Medic, responsável pela importação e distribuição dos produtos da Genrui Biotech no Brasil, bem como com a companhia chinesa, mas não teve retorno até a publicação desta verificação.

Em 7 de janeiro deste ano, a Autoridade Nacional do Medicamento e dos Produtos de Saúde (Infarmed), órgão de farmacovigilância do governo de Portugal, emitiu um comunicado dizendo ter sido informada de 550 incidentes de falso positivo com os testes da Genrui na Irlanda. Por isso, os testes dessa marca seriam recolhidos em Portugal, embora no país, até o momento, houve o registro de apenas sete casos de falso positivo entre 7 milhões de autotestes da fabricante distribuídos ao mercado.

Em 28 de janeiro, a Infarmed disse que, após investigação feita pela fabricante, concluiu-se que o problema dos falsos positivos teria ocorrido por causa de contaminação durante o processo de fabricação da solução de diluente usada em dois lotes específicos: 20211008 e 20211125. À época, os dois lotes estavam sendo recolhidos do mercado europeu.

No Brasil, em 9 de outubro de 2020, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) emitiu um alerta de tecnovigilância em relação a testes de covid-19 da Genrui. No caso brasileiro, o pedido era apenas para que fossem atualizadas as informações sobre a sensibilidade do produto, que havia sido reportada de modo incorreto nas instruções de uso de um lote específico: 20200505.

“O fabricante foi informado, investigou o ocorrido e concluiu que as informações das instruções de uso foram baseadas no estudo clínico inicial, que apresentou resultado de 100% para sensibilidade e especificidade. Porém, após novos estudos, observou-se variação nos referidos parâmetros, que não havia sido considerada para a elaboração das instruções de uso. Portanto, as instruções de uso foram atualizadas com as informações corretas dos parâmetros”, diz o texto emitido pela Anvisa.

O que dizem os especialistas?

De acordo com os especialistas procurados pelo Comprova, a reação mostrada no vídeo é enganosa na medida em que acontece um desvio de finalidade do teste. Para os profissionais, embora a reação química apresentada gere um resultado positivo, isso não significa que os testes não sejam confiáveis ou seguros.

Maíra Mello Rezende Valle destaca que o resultado apresentado no vídeo, embora possa ser verdadeiro, não indica a presença da covid-19, uma vez que a variação de pH (nível de acidez ou basicidade) pode alterar a sensibilidade do teste.

A pesquisadora explica que os testes rápidos, como o de antígeno (que é utilizado no vídeo), têm anticorpos capazes de reagir à presença do vírus. Quando a amostra coletada é colocada na solução própria para testagem, acontece a quebra do vírus em partículas menores. A solução, em contato com a lâmina, gera uma reação química que provoca a mudança da cor da linha.

“(O teste) tem o anticorpo acoplado na lâmina e quando você coloca um antígeno que vem, por exemplo, com a sua saliva ou com o seu sangue, ele vai aglutinar ali e vai gerar uma cor que é aquela linhazinha. Só que esses anticorpos são substâncias químicas também, principalmente proteínas. A proteína muda a conformação dela de acordo com o pH. (…) O que é o limão? É uma substância extremamente ácida; ele tem ácido cítrico”.

Valle explica, então, que esse uso do limão é responsável por burlar o teste, fazendo com que apareça a linha indicadora do positivo. A pesquisadora ressalta, no entanto, que “não necessariamente existe positividade no teste”.

O farmacêutico Miler Heleno Teixeira ressalta que os testes para covid-19 foram criados especificamente para testagem humana. Uma vez que o produto é colocado em contato com outras substâncias, como o suco de limão, o resultado pode ser afetado. “A pessoa que fez o teste (no vídeo) com limão provocou uma reação que não é normal, sinalizando positivo. Mas é um resultado inconclusivo, não quer dizer que o limão tenha covid”.

Embora o resultado apresentado no vídeo seja positivo, Teixeira ressalta que não é possível estabelecer relações únicas entre o ácido e o resultado apresentado.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Fonte: CNN Brasil

Foto: Reprodução

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