Masculinidade tóxica estava presente na morte de Mc Kevin e o matou

Quando se fala em seguros de carros, dizem os estudos que os homens pagam até 23% a mais no valor da parcela do que as mulheres. O motivo, talvez, já tenha surgido na sua mente: elas são mais cuidadosas no trânsito. Essa informação pareceu um ótimo gancho para falar sobre um assunto que rodeou uma grande tragédia que aconteceu na última semana: a morte de MC Kevin, aos 23 anos, depois de uma queda do quinto andar de um hotel no Rio de Janeiro.

As ações que levaram à morte do músico não necessariamente importam aqui. Basta saber que, depois de uma briga com a esposa, a advogada Daolane Bezerra, Kevin foi “curtir com os amigos” e terminou o dia em um sexo a três – ele, um amigo e uma modelo. O que aconteceu na cama é igualmente desimportante. No entanto, a masculinidade tóxica que o levou até lá, importa para os objetivos deste texto.

amos voltar rapidamente aos valores de seguros. Se você pensar em uma mulher que dirige, as chances de ela ser mais cuidadosa com o carro desde o momento em que tirou a carta de motorista, é bem maior. Isso, também, pode ser um reflexo de toda a forma como a sociedade é estruturada e talvez também tenha a ver com o tal “instinto materno”, que podemos chamar de instinto de proteção, que as fazem prestar mais atenção, com um todo, em coisas que não necessariamente os homens percebem – mas todo ser humano deveria.

Elas costumam ser mais pacientes no trânsito, menos explosivas e mais atentas ao contexto da rua em que estão dirigindo. Por outro lado, pense em homem jovem. Não vamos cair no âmbito da generalização – os fiscais do “não é todo homem” devem aparecer em breve, aliás -, mas, via de regra, eles são mais “ousados”.

Mais uma vez, os números não mentem: só no primeiro trimestre de 2020, segundo o Sistema de Informações Gerenciais de Acidentes de Trânsito do Estado de São Paulo (Infosiga), os homens foram responsáveis por 94% dos acidentes de trânsito causados no Estado.

A justificativa para esse alto índice de acidentes é comportamental. Enquanto as mulheres, como dito acima, têm uma tendência mais paciente e cuidadosa no trânsito, os homens tendem à competitividade e à agressividade. Pense nos filmes “Velozes e Furiosos”, por exemplo, que mostra diversas cenas de dois veículos lado a lado, em que um dos motoristas começa a acelerar o carro, mesmo com o farol fechado. Quais as chances de o motorista do outro carro não fazer o mesmo, se ele for um homem? É o desejo competitivo de ser melhor, muito alimentado pelo ideal do macho alfa – o cara que precisa ser superior em todo, inclusive no nível de desejo que gera nas mulheres ao redor.

Sim, sem revirar os olhos, o tema é masculinidade tóxica

Voltemos, então, ao caso de Kevin, e como todos esses dados se costuram num termo que gera muito revirar de olhos em quem não entende do assunto: masculinidade tóxica. A masculinidade é um conceito muito predominante no nosso dia a dia e que pode ser caracterizado como uma ideia de que os homens precisam ser fortes e viris, com poder e voz ativa, e que não demonstram os seus sentimentos. Pense no clássico “Menino não chora” que muitos pais (e mães) já falaram para os filhos ao longo da história.

Em um caso como o de Kevin, a tragédia foi o resultado de muitas decisões que, com certeza, tiveram a influência dessa toxicidade. Basta alguém dizer que Kevin, como um homem famoso e rico, pode ficar com quantas mulheres quiser e que a esposa precisa lidar com isso. Basta outro alguém dizer também que, por ser rico e famoso, as suas ações não terão consequências.

Não é à toa que a vida dos homens costuma ser mais curta que a das mulheres. De novo, os números sustentam essa premissa. Segundo a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), eles vivem em média 5,8 anos menos que elas porque “as expectativas da sociedade contribuem para comportamentos de busca de riscos”. Em números mais duros, quando se fala na população masculina das Américas, 1 em cada 5 homens não vai chegar aos 50 anos por causa disso.

Por conta dessa expectativa de serem os provedores da família (ou seja, “quem coloca comida na mesa”), de serem dominantes sexualmente (pense na ideia do “pegador”) e da falta de estímulo para olhar e lidar com os próprios sentimentos, os homens vivem uma realidade complexa que resulta em índices maiores de suicídios, doenças crônicas, vícios, homicídios e acidentes de trânsito entre a população masculina.

Resumir a masculinidade tóxica a algumas características predominantes nos homens é raso, e defini-la como a causa da morte de Mc Kevin, também. Em ambos os casos, é tudo muito mais profundo e com muitas outras nuances além das consideradas – basta perceber, por exemplo, que essa toxicidade respinga (muito!) nas mulheres como um dos combustíveis da violência doméstica. Mas fato é que essa visão de um homem perfeito que transa com quem quiser, é forte, não se abala emocionalmente e se arrisca além do necessário não só adoece como mata pessoas.

No fim, fica só a sensação de luto e, muito possivelmente, de impotência de quem ficou para trás. Como a mãe de Kevin, mais uma vítima da violência contra mulher. Mas uma coisa não muda: a necessidade de rever, e com urgência, a maneira como os homens são criados e a forma como comportamentos como o de Mc Kevin, apesar de condenáveis em alguns níveis por alguns, são estimulados.

 

 

 

 

 

Fonte: Yahoo!

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