PM responde a ataque com mensagem de luta e resistência ao racismo
“Nossa luta continua. Ela é presente”, disse nesta quarta-feira (10), o tenente-coronel da Polícia Militar (PM) de São Paulo Evanilson de Souza, sobre ter sido alvo de ataque racista feito por hackers, no dia anterior. Ele foi chamado de ‘macaco’ e outras ofensas, durante palestra virtual organizada pelo Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (USP).
Na manhã desta quarta, ele foi a uma delegacia na zona Oeste da capital paulista para tentar registrar boletim de ocorrência por racismo e invasão cibernética. Evanilson quer que a Polícia Civil instaure um inquérito para investigar o caso e buscar identificar e prender os responsáveis pelas ofensas.
A PM repudiou o ataque racista ao coronel com uma nota divulgada em suas redes sociais. A corporação reforçou sua posição contra a discriminação e informou que tem como “missão promover os direitos humanos.”
O Instituto de Relações Internacionais da USP divulgou nota na qual classifica o que aconteceu com Evanilson como “crime inaceitável que fere os princípios constitucionais da honra e dignidade da pessoa humana”. Os coordenadores do curso enviaram denúncia à uma delegacia especializada.
“É um crime de racismo aliado a um crime cibernético”, afirmou o oficial da PM, que quer que o autor ou os autores do ataque sejam identificados, presos e punidos. Até a última atualização desta reportagem, o boletim de ocorrência do caso ainda não havia sido registrado no 14º Distrito Policial (DP), em Pinheiros.
Segundo Evanilson, um hacker que invadiu a plataforma começou a escrever palavras racistas sobre a tela compartilhada da palestra quando o coronel começou a falar. Também foram enviados comentários de preconceito no chat. O curso chegou a ser interrompido em razão das ofensas. Depois foi retomado em outra plataforma.
“Me sinto como um homem negro que foi afrontado por indivíduos que tentaram desqualificar a minha qualidade profissional e de ser humano”, lamentou Evanilson. “Isso que acontece no dia a dia do homem negro, da mulher negra, dentro de um espaço racista estruturalmente.”
‘Não é uma luta pessoal’
Evanilson falou ainda que vai usar o ataque racista que sofreu para se tornar mais forte no combate a ele.
“Nós não vamos esmorecer. Isso não é uma luta pessoal . isso não é uma luta da comunidade negra. Isso é uma luta da sociedade brasileira”, falou o coronel. “Porque enquanto o Brasil não eliminar racismo nós não conseguiremos evoluir socialmente, economicamente”.
O ouvidor da polícia, Elizeu Soares Lopes, que também é negro, prestou solidariedade ao coronel. “Atenta-se contra o Estado. Ele foi agredido de uma forma covarde e simbólica. Estava tratando de uma palavras com a temática étnico racial”, falou Elizeu, que também é negro.
Em entrevista ao G1 em dezembro do ano passado, o tenente-coronel Evanilson falou sobre seu trabalho na revisão do manual de Direitos Humanos da Polícia Militar.
“O negro tem pressa, porque é muito tempo sofrendo a mesma coisa. O racismo está enraizado nas pessoas historicamente e culturalmente e elas não percebem isso”, disse Evanilson naquela ocasião.
O novo manual, segundo ele, tem o objetivo de “contribuir para a desestruturação do racismo estrutural”.
A ideia de se reformar o manual, de acordo com ele, é fazer com que os policiais paulistas reflitam e se conscientizem de que o racismo está presente no dia a dia nas ruas e identifiquem atos discriminatórios próprios e de colegas que possam ser corrigidos.
O atual manual da PM é de 1998 e a nova versão, segundo Souza, deve ficar pronta no 1º semestre de 2021.
Tenente-coronel Evanilson diz que novo manual quer conscientizar PMs. ‘Não será caça às bruxas’.